quinta-feira, 23 de junho de 2011

Crônicas de nada


Há um vazio. Há uma bolha de ar entre dois lábios. E não há nenhuma sensação na barriga. E os pensamentos ocorrem. E não se perde o fôlego. E há o vazio. Mas a mente está cheia. Mas não há ninguém dentro dela. Mas ainda há um beijo.
“Eu dei o teu nome pra uma estrela e no outro dia eu a perdi”. E o universo é um vazio ínfimo próximo ao vazio no coração. E não há motivos pra se estar triste. A alegria tão pouco se manifesta. E contam-se os dias pra uma viagem. Pra uma nova vida. Ou um novo amor. Sempre haverão boas músicas pra quando há um vazio, ou uma inspiração. E os acordes contam a nossa história mesmo sem intenção.
Sempre haverão bons amigos com quem conversar. E sempre haverão coisas que não falaremos mesmo assim. E há um vazio porque não se quer pensar naquilo que não há ou haverá. Nem mesmo se sabe o que é, porque não há. Não mais. Mas os beijos podem significar mais para os outros lábios. Mesmo que não hajam palavras. E haja o vazio.
E despedem-se com piadas sarcásticas. As palavras mudam, mas os jogos são os mesmos. Quem joga os dados olhando nos olhos, ganha. Mas não sabe como jogar quando não há jogo. Mas sentimentos. E as neuroses tomam conta dos copos. E perdemos estrelas.
Dentro de muitos há um todo. Mas dentro de outros não há ninguém. Por que já houve um todo, que nem mesmo muitas coisas podem preencher. E escolhemos esquecer. Trabalhar. Ler. Assistir. Beijar. Escrever. Mas o vazio ainda está lá. E ele não sente os lábios se tocarem. Não há mãos tremulas. Apenas confiança. E nesse caso, ela não preenche ego, ou qualquer outra coisa. É um anexo do que se pode sentir. E quando se pode fazer algo maior, escolhemos o vazio.
O vazio não machuca. O vazio não nos traz lembranças ruins. Apenas existe. Ele nos deixa respirar. E não nos dá dor de cabeça. Muito menos nos irrita. O vazio é deprimente. Não nos alegra. Não nos traz lembranças felizes. Ele não nos tira o fôlego. Apenas não existe. É um vazio.
Querer preenchê-lo só o faz mais vazio. Se alimenta de cigarros, música, livros, dilemas alheios, copos translúcidos com líquidos azuis e ausência de palavras. É uma dor anestésica. Um sentimento insensível. E então ele nos esfria. O vazio se enche de significados que não significam-se. Somente para acalantarmos a idéia de que estamos ganhando um jogo que não existe. E nós o ganhamos. Mas na estante há um vazio onde o troféu deveria ocupar.
Mesmo estando preenchido agora, encare o fato de que um vazio pode existir. Não existindo. Porque quando não há tampouco se sente. Mas muito se pensa. Dê o nome de alguém a uma estrela e esqueça a qual. Ela ainda estará lá. Poucas palavras podem descrever o vazio quanto esta: “amei”.
Então ame. Porque não há nada mais cheio. Vale a pena sentir-se vazio sabendo que já esteve-se transbordando. Recomendo tomar o copo todo antes que a bebida esquente e você tenha que engoli-la com desgosto. Tome até a última gota. E mantenha o gosto nos lábios. Espere que alguma hora o garçom volte e preencha seu copo vazio. Se ele não voltar tenha em mente que a última dose é sempre a melhor. Sinta-se vazio somente quando compreender o significado de estar completo. O vazio não machuca então não há o que temer. O vazio não agrada então não há o que esperar. O vazio não nos faz gozar. O vazio apenas não existe. E não há.

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